Poesia de garagem, música, descrições e indiscrições. Um blog tardio mas que nasceu de sete meses, angustiadinho e agora com algumas revisões gramaticais.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Experimento Azul (e um primoroso achado musical)

De: Leary Houdini leary.houdini@gmail.com
. Data: 6 de abril de 2010 08:37
. Assunto: Experimento Azul (e um primoroso achado musical)
. Para: gbandini@gmail.com


Dear Bandini.

Ja conto alguns varios meses sem contato com voce, bom amigo. Penso que deve estar curioso dos motivos de meu desaparecimento desde minha ultima missiva onde te contava de meu breve retorno a minha natal "Rotterdamn".

Bem, estive alguns lugares nessa lacuna de meses. Perderia um tempo precioso nesta lan house em que me encontro aqui en Sonora, Mexico. Pois tento ir ao assunto logo e repleto de justificçoes. Sim, estive muito proximo de sua cidade ha pouco e, nao, nao liguei para voce uma vez que tenho poco tempo para passar ai. Entretanto tive tempo bom para uma interessante aventura que relato a ti nesse momento.

Estava com minhas bagagens prontas para partir para Mexico quando o acaso me mostrou esta foto:


Este mushroom me pareceu fantastico, entao fui atras de meus contatos e cheguei a Luiz Carlos Dogson, alguém que conhecia o fungo, sabia onde encontrar, entendia minhas intensoes e garantia uma experiencia de nao esquecer. Cheguei em Belem e fui recebido por Dogson que levoume no mesmo dia para o local onde poderiamos encontrar meu fungo azul. O lugar fica em uma regiao nao muito longe de sua capital. Esta em beira de uma estrada que me parece nova, com pontes enormes, nao lembro nome. Entramos no terreno quatro horas de tarde e todo cercado de arvores e mato so consegui ver uma casa pequena, um barraco de madeira nova sem tinta para onde fomos. Larguei a mochila na unica mesa que havia no unico comodo da casa, ao lado de um pc bem antigo. Minha barriga fazia barulhos com o ceu que nos ameaçava com chuva. Luiz Carlos disse que tinhamos que aproveitar a luz para encontrar o cogumelo e entao invadimos a mata. Bem facil a caminhada dentro da floresta nao muito fechada. A variedade de formas e tamanhos e cores e vida em un lugar tao proximo de uma estrada de grandes e pequenos veiculos com seus barulhos e gases que nao pareciam afetar a harmonia do local me desorientou por um segundos. Luiz seguia com facao abrindo o caminho com gentileza e antes que eu pudesse acostumarme com a tranquilidade do lugar, o maldito gritou: achei!. Achei o danado mais cedo que eu pensava. Estava perto das raizes de uma arvore especialmente grande, entre o amarelobegemarrom da folhagem do eterno chao de outono que alimenta a floresta da Amazonia. O contraste era fenomenal e dizia claramente que aquele pequeno ser de camurça azul concentrava segredos, guardava chaves naturais, conectava pontos entre a vida, a magica e a morte. Dogson me disse para colher a coisa uma vez que seria eu quem o consumiria. Minha barriga acompanhou outro trovão e lembrei que precisava comer algo alem do serviço de bordo. Luiz Carlos foi firme ao dizer que eu deveria comer algo leve e me levou para um sitio vizinho.

Andamos por menos de seiscentos metros e estavamos em frente de uma pequena barraca ocupada por uma jovem preta quase india ou o inverso. Minha fome mudou. Na barraca podia ver cuias num recipiente com agua, duas panelas e um pequeno fogo dançando para uma frigideira, mas meus olhos nao registram nada. Eu via o labio enorme, o colo, voltava para as maças escuras do rosto e entao pra olhos mais negros de abismos. Luiz me acorda pedindo para a preta duas tapioca. Ela olha direto para mim perguntando numa voz quase masculina se aceito coco ou manteiga e Luiz responde: nao precisamos de mais nada. Benéééééé! Uma voz grita do fundo do terreno chamando a preta. Pagamos os pequenos sandwiches e tomamos o caminho da volta.

Comendo bem devagar, na velocidade dos nossos passos em direçao a casa, me pego pensando na minha idade, Bandini. Quanto tempo ainda tenho para minhas pesquisas? E quando chegar o fim, eu terei a resposta instantanea? Ou vou ter que recomeçar do ponto zero, companhero? O certo e que a preta me voltou a cabeça e tentei expulsala quando entrei no barraco do Dogson. Ele me ajudou falando sobre os "perigos" da "viagem", que ninguem morria daquilo mas que o transe (palavra dele) era forte. Falou isso enquanto ia preparando a infusao. Me agradou ver a preocupaçao dele comigo. Esse tipo de cuidado (por mais desnecessario que seja para alguem como eu que estuda o assunto) cria um clima aconchegante e pouco familiar se comparado a maioria das minhas experiencias. Lembrei de voce. E nesse mesmo instante Luiz Carlos me contou algo que so me fez reforçar o pensamento em ti. Tirou de uma bolsa de nylon um disco que disse ser perfeito para a ocasiao.

Colocou no pc e comecei a escutar o canto intrincado de um passaro que ele me disse ser uirapuru, logo entra os sons de um guitar acompanhando, ou melhor, imitando a melodia do bicho. A musica logo cresce com outros instrumentos, synth, percursaos e percebo que e algo como progressive rock . Ai vejo que nao e rock. A musica continua e outros ruidos aparecem: o sonido de um jaguar, algo tribal e então o synth parece improvisar. Muito belo e interessante e diferent. Ele me deu o disco nas mao e pude ler Timbres da Natureza Amazonica de alguem chamado Albery Albuquerque Junior. A musica seguia muito bonita, muito experimental. Sabes que muito me interesso por musica e por um instante esquecí para que estava ali. Comecei ler o que havia no disco enquanto Luiz me explicava mais sobre o que ouvia. E era muito mais que simples música. O disco e um documento de uma pesquisa desenvolvida por Albery onde ele estuda os timbres de alguns animais, seus cantos de ataque, de sedução, avisando sobre perigo. Ele estudou animais muitos como tucanos, macacos guaribas, papa formigas e conseguiu criar "escolas musicais" destes e outros bichos. Estou completamente impressionado e entusiasmado com isso. Então, Dogson me falou que este era apenas o primeiro estudo feito por Albery. Ele hoje tem mais dois projetos de pesquisa, Um trata da relaçao de musica com geometria (deve ser algo derivado da teoria matematica de musica), Luiz Carlos diz que ele consegue decifrar (nao sei se a palavra se aplica) a musica tendo apenas as medidas de arquitectura da façada de uma casa ou de um quadro cubista, por exemplo. E consegue o inverso tambem: criar a imagem grafica extraida da partitura de qualquer musica! Me parece algo como uma revoluçao na historia da musica. Fiquei pensando que Dogson estava me pregando uma peça. Mas tive certeza quando ele me disse que o tercero projeto desse musico-cientista ou o que seja chamase Musica Quantica. Musica Quantica, Bandini! Soltei uma risada alta na hora, mas Luiz me garante que Albery tem um livro onde explica toda sua teoria. Conheces esta pessoa, Bandini? Tens como me fazer entrar contacto com ele? Se algo nesta história tiver uma pequena chance de ser verdade isso pode me ajudar profundamente em minha propria busca.

A noite envolveu o barraco enquanto a infusao aprontava. Tomei um banho e voltei pensar na preta. O desejo nunca envelhece, so se aprimora. Porque a carne não acompanha o maldito espirito? Porque o espirito não desafia a bendita carne? A noite esta morna mesmo fora do barraco. Dogson tem um copo de uma cor indefinida na mao quando eu entro. Um azul palido e um poco leitoso. Ele me entrega. Eu tomo.

Começamos uma conversa sobre banalidades. Ele me fala do que pensa em fazer com seu sitio e seu sonho de transformar aquilo num pequeno paraiso de borboletas. Uma poca excitaçao me ocorre seguida de uma sensaçao de moleza no corpo como um sono. A viagem para ali tinha sido mesmo cansativa. Me sento para descansar numa especie de poltrona suspensa numa viga do barraco. Um pequeno ninho perfeito. Me sinto aconchegado e bem. Afundo aos poucos no ninho e minha musculatura fica mais flacida que o normal. Ja conheço a sensaçao. Luiz coloca outro disco no computador, agora parece um mantra e nem mais me interesso em saber o que toca. A pouca luz da noite se intensifica, mas levemente. Fecho os olhos e tudo começa.

Lembro pouco do que aconteceu desde ai, Bandini. Sei que os sons se ampliaram e o mantra se fundiu com o som de floresta ao redor. De repente consegui entender o que os sapos coachavam de mim. Grilos trinavam num compasso distante mas preciso e uma coruja (pelo menos acho que era) velava meu sono acordado. Completamente imerso na polrona, comecei a penetrar a floresta. Andei seguindo os sons dos grilos e de um batuque que provavelmente era a minha propria pulsaçao, até achar uma pequena clareira. Durante um bom tempo so fiquei observando a mata aberta, entao aos poucos foram surgindo uns pretos bem magros com atabaques. No centro da clareira vi uma fogueira verde crepitando, as labaredas intensas não eram linguas de fogo, eram folhas ondulantes que subiam para o ceu. Permaneci o que pareceu horas mirando a folheira, observando a sua movimentaçao sensual. Os tambores ficaram mais fortes e então a preta apareceu atraves do movimento da folheira como se imitasse o cambalear do fogo de esmeralda. Ela sorriu para mim e nao havia nenhum dente em sua boca. Nao parecia estar vestida, tampouco estava nua. Algo naquele mundo protegia a preta de qualquer luxuria. Mas ainda assim sentia algo de desejo ardendo e suando minha pele. Ela me pediu, sem palavras de uma arcada sem dentes, que seguisse com ela e atravessasse a clareira. Segui. A folhagem da mata fechada batia suave contra meus braços, meu rosto e continuei sem medo ate que um pequeno vale surgiu. Nao era exatamente um vale, em verdade o lugar mudava de forma a cada nuance do olhar. Acompanhei com os olhos a grama rente e no topo de um pequeno morro vi a arvore. Nao era grande. Nao tinha folhas. Parecia branca e dos seus poucos galhos pendia uma unica fruta. A preta me olhou, abriu a boca e eu pude ouvir pegue a fruta cor. E então a linda preta evaporouse. Nao sabia bem o que deveria fazer, mas sentia um impulso incontrolavel de arrancar aquela fruta do galho. Notei que a fruta não era exatamente branca, podia enxergar o padrão que eu quizesse nela. Comecei a caminhar na direção do morro. A cada passo sentia uma especie de poder se aproximando. Como se ali eu fosse encontrar minhas respostas. A cada metro tinha mais certeza de que aquele sumo seria um balsamo. Minhas maos apontavam como duas garras em direção ao galho. A fruta cor era o Desejo. Não, era muito mais. Era a propria Verdade. Estava num extase maravilhoso. A seis passos de tudo o que eu tanto procurava. Foi quando o negrume se fez. A tronco e os galhos tornaram ebano e a fruta enegreceu tanto que parecia azul. O azul da noite infinita. O azul do universo que engolfa estrelas. Um azul mais negro que a morte, Bandini.

Abri meus olhos de medo.

Tudo continuava calmo no barraco e Dogson dormia um sono profundo. O disco tinha terminado horas atras, provavelmente, e o dia tentava longe se levantar. Acordei o anfitriao e saimos para tomar um cafe. Nao contei nada a ele, Bandini, menti. Nao contei nada a ninguem ainda, o primeiro es tu. E bem verdade, nao tinha contado essa historia direito nem mesmo para mim. Estou contando agora no mesmo momento em que conto a ti.

Me sinto mais perdido do que antes, agora. Nao sei bem se meus projetos devem continuar. Precisava muito encontrar contigo mas nao sei bem se adiantaria alguma coisa. Hoje apenas nao sei.

De qualquer forma, estou bem longe aqui no Mexico mas devo sair logo. Te peço desculpas de novo por minha ausencia estando tao proximo de ti. E prometo entrar mais em contato para conversarmos amenidades, manter nossos estupidos jogos de trocadinhos, falar e ouvir musica.

See you soon, son.
Leary Houdini


P.S. : Nao te peço desculpas por meu portugues, uma vez que nao falas minha lingua, seu filha da puta. Desisti de ficar acentuando as palavras dessa tua lingua ingrata. Ja fazia isso antes, tu bem sabes, mas agora e oficial. Ok, eu sei que meu deutch tambem tem acentos. Por isso eu digo: Levantemonos contra os acentos!

P.P.S.: Achei Albery aqui: http://www.myspace.com/alberyalbuquerque conheceo now!

3 comentários:

Paulo disse...

Rapaz... tou sem palavras.

Unknown disse...

Meu nome é Robsom. Fiquei muito maravilhado com esse ouro-celeste- musical, do Albery.
Será que ele transforma mesmo música em geometria, e geometria em música?
Para que eu viesse a ter uma resposta sobre esse músico iluminado, pesquisei um pouco mais sobre ele, e constatei que tudo é verdade, que não é uma ficção científica, nem é também um conto de fadas, é real, real mesmo, e aí meu camarada, me maravilhei profundamente!
Foi-me dito por terceiros, que ele já tirou músicas que estão contidas nos desenhos geométrico que enfeitam as asas das borbuletas, e que fez sinfonias com as frequencias extraidas dos perfumes de flores e rosas. Esse cara é desse mundo?
Ele tira a música do tempo, do comprimento do ângulo, do número da energia, da massa, da velocidade. Tira Música das estrelas, da eletrecidade, do magnetismo, do eletromagnetismo, (Ondas de rádio, de televisão, de luz, das microndas...rais gamas...) Quem é esse Anjo Sagrado da Música?
E ele veio aparecer justamente agora, na grande mudança!
Albery, que a auréula de luz sagrada, que Deus te deu, continue para sempre te envolvendo. Soube também que os teus caminhos são conturbados, pois trazes luz para todos, por isso são caminhos tortuosos. Mas não tem nada não meu nego, vai em frente. Eu estou contigo.

Robsom

Edilan disse...

O Cara é FOOOOOODDDDDDDAAAAAAAA! Pensei também que ele tinha saído de uma ficção científica! Mas que nada ele é um Verdadeiro AVATAR da Música Mundial. O Libertador que indica novos, novos, caminhos, nos libertando da porra da mesmice.
Valeu, Albery é um novíssimo valor musical que tem que ser explorado. Porra o cara tem a cara da Música, ou melhor, ele é a Música propiamente dita. Não é esagero não.
Sou agora fã dessa figura. Mas cadê o cara? Porque ele não aparece? Precisamos pesquisar sobre ele para conhecer o seu trabalho?
Fica aqui o meu profundo abreço por essa figura, e o meu protesto por ele está fora do conhecimento de muita gente.