Poesia de garagem, música, descrições e indiscrições. Um blog tardio mas que nasceu de sete meses, angustiadinho e agora com algumas revisões gramaticais.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Aquecimento.

Encosta o carro e disca o número. Chama uma, duas, cinco vezes. Ouve um pequeno chiado antes da voz de uma modulação enjoativa que ele consegue imaginar o perfume que ela está usando.

- Grupo Gerador São Paulo. Patrícia. Em que posso lhe ser útil?
- Mal!
- Senhor, não entendi bem.Você poderia...
- Dirige mal pra caralho.
- Que? Senhor...
- Não sabe guiar. Um barbeiro de bosta. Vocês não perguntam “como estou dirigindo?” mal pra caralho.
- Mas quem liga pra isso, deus meu? O senhor vai me desculpar, mas com esses modos não vou poder lhe atender. O que o senhor deseja?
- Dizer que tomei uma cortada tão filha da puta de um caminhão de vocês  que por dois dedos um fretado não destrói  a minha traseira com minha tv, o ventilador e os cacete dentro.

Uma carroça carregada de madeira e refugo passa rente ao retrovisor e ele pode ver o carroceiro saltando apoiado em cima da carreta como se conseguisse frear. O olhar fulminou o homem na carroça que seguiu com um sorriso que era escorria deboche..

- Senhor, todos os nossos motoristas são registrados e fazem um teste lá que é bem puxado.
- A senhora não pode estar falando sério.  Esse escroto por pouco não arranca o meu pisca da esquerda, jogou um celtinha de lado que quase sobe uma garagem. Rasgou o amarelo sem um pingo de colhão pra enfrentar quem ficou no vermelho. Vocês deviam pelo menos me mostrar a cara desse filho da puta.
- Caro cliente, a Grupo Geradores São Paulo tem disponível para locação grupo geradores que variam de 2,5 KVA...
- Hã?
- Até 500 KVA. São doze anos de tradição atendendo construção civil, minerações, empreendimentos, emergência, eventos e etc.
- Mas que porra é essa?
- Caso o senhor não possa vir ao nosso escritório, posso efetuar o seu cadastro em um instante. Adianto que não atuamos no ramo de auto-escola, mas o que o amigo precisar de gerador, conte com a gente.
- Puta que pariu, mas que merda é essa? Tô com um assunto sério aqui e uma filha da puta vem fazer graça com a minha cara?! Quem tem que mostrar postura pro consumidor falta com o respeito. Em que porra de cidade a gente vive? A gente vê isso na rua, igual a esses motoristas de merda de vocês. Esse trânsito é a porra duma foto da sociedade que anda nele. Um canalha entra no carro, fechado lá dentro se sente protegido, pode fazer a merda que quiser. Aí mostra a calhordice de fechar cruzamento, dá cortada nos outros. Marmanjo enfrenta velhinha, velhinha...
- Osíres, traz mais papel aqui que a impressora ta engolindo tudo.
- Alô! Alô? Sua filha de uma putíssima!
- Vá toma no cu.
- Me ouve aqui! Não desliga essa porra. Porra.

Trinca o visor do telefone com um golpe no painel. Então recosta a cabeça no banco. Inspira uma, duas vezes.  Mantém o pé na embreagem e engata a primeira antes de virar a chave do carro. Liga subitamente o limpador do pára-brisa no lugar do pisca. Se assusta com o barulho da borracha contra o vidro. Desfaz o engano. Olha para a pista. Acelera. Faz a volta. Sube a rampa do posto e as rodas giram lentas até pararem em frente à conveniência. Segue direto para o balcão, quer um free e um halls azul. Encosta perto da porta de vidro de onde pode ver dois moleques apedrejando uma caixa de correio; um vira-lata rosnando pra uma bicicleta. A boca esboça algo entre um suspiro e um sorriso. Mastiga o primeiro drops de halls e pensa que já é hora de pegar a estrada.

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